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Luís Gomes
Luís Gomes
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Nos últimos tempos, tem-se falado por diversas vezes da inevitabilidade das moedas digitais dos Bancos Centrais. Segundo muitos, não só podem implicar o desaparecimento do dinheiro físico, como também terminar com o papel das Criptomoedas.

Há mais de um ano ocorreu um discurso muito esclarecedor a este respeito. Tratou-se da intervenção do Sr. Agustín Carstens, o Director Geral do BIS (Director Geral do Bank for International Settlements), o Banco Central dos Bancos Centrais, que teve lugar a 27 de Janeiro do ano transacto, no âmbito de um seminário que se realizou na Basileia, Suíça, acerca das Criptomoedas e moedas digitais dos Bancos Centrais.

No início do seu discurso, lançou a pergunta: necessitamos de moedas digitais? Se sim, quem as deveria emitir?

Começou por lançar uns encómios à economia digital; segundo as suas palavras, a revolução digital permite que uma enormíssima quantidade de dados seja coligida, tratada e transmitida, reduzindo o custo de processamento de muitas tarefas; por outro lado, permite a criação de aplicações que podem tornar-se disruptivas em certas indústrias, como é o caso dos táxis (Uber) ou das telecomunicações (Whatsapp). Isto era algo que já sabíamos, até aqui nada de novo.

Seguidamente, voltou a falar de algo igualmente conhecido, mas ocultando alguns detalhes que julgo de extrema importância: o dinheiro na sua presente forma já é digital há muitas décadas, como é caso das contas bancárias, no entanto, sem mencionar que esta forma de dinheiro digital apresenta várias deficiências:

  • Trata-se de algo que não é propriedade do titular da conta, juridicamente é apenas um empréstimo ao banco, algo desconhecido de muitos
  • A segurança do depósito bancário implica enormes custos – informáticos, recursos humanos, auditores – e está dependente da supervisão de uma entidade central, por forma a assegurar a solvência e o correcto registo das operações (transferências, depósitos, levantamentos…) pelo banco;
  • Não assegura o anonimato do titular, pois actualmente os bancos comerciais tornaram-se extensões das autoridades tributárias; agora, são apenas balcões das finanças com uma placa no seu exterior a indicar que se trata de um banco.

Afirmou também que o desaparecimento do numerário e das contas bancárias não é realista nem desejável, no entanto, perpassa sempre a sensação de que existe a vontade de enviá-las para os livros de história.

A existir dinheiro digital, segundo a sua visão, poderiam existir dois modelos:

  • um descentralizado, em que as decisões são tomadas entre todos os membros da rede, isto é, as transacções são validadas por um consenso entre todos os participantes da mineração, o modelo adoptado pelo Bitcoin, por exemplo;
  • um centralizado, em que uma entidade “confiável” assegura a integridade do sistema monetário.

Seguidamente, o Sr. Agustín Carstens lançou críticas ao modelo descentralizado, em particular ao método “Proof of Work”, utilizado pelo Bitcoin. O “Proof of Work” é um mecanismo de consenso descentralizado, requerendo aos membros da rede que resolvam um problema matemático arbitrário, com o intuito de impedir que alguém engane o sistema, para poderem minerar ou validar transacções. Quais foram as suas principais críticas?

  • retira no longo prazo os incentivos aos participantes na emissão de novos tokens: porquê? Como o Bitcoin está limitado a uma emissão de 21 milhões de tokens, a nova emissão que ocorre no fecho de um novo bloco é cada vez menor, gerando uma compensação decrescente ao longo do tempo aos participantes da rede Bitcoin. Desta forma, a qualidade e a segurança da rede irá diminuir, atendendo que as transacções apenas são validadas após o fecho de um dado bloco, havendo menores incentivos a realizá-lo;
  • prejudica o clima, pois consome energia que equivale a um país como a Suíça. Já comentei este “mito”, no meu artigo “A guerra sem quartel às Criptomoedas”, um argumento recorrentemente utilizado para “atacar” o Bitcoin que não parece intelectualmente sério.

Um dado que o Sr. Carstens se esqueceu de mencionar foi a possibilidade do sistema de governo da rede Bitcoin ser alterado: em lugar de “Proof of Work”, o “Proof of Staking”; qual a diferença?

No caso do “Proof of Staking”, os mineradores de Criptomoedas podem minerar ou validar transacções em bloco, com base na quantidade de moedas que cada minerador possui. Isto desincentiva os ataques à rede, atendendo que os mineradores mais prejudicados são precisamente aqueles que têm mais a perder.

Desta forma, esta última solução já foi adoptada por um grande número de Criptomoedas, as denominadas Altcoins – criptomoedas que não o Bitcoin -, eliminando, desta forma, o enorme consumo de energia que o “Proof of Work” representa. Tal, só foi possível graças ao pioneirismo do Bitcoin que criou um mercado de activos virtuais. Em conclusão, trata-se de mais uma objecção que não me parece ter sentido.  

Depois, o Sr. Carstens derivou a sua atenção para Criptomoedas estáveis – as denominadas StableCoins. Estas criptomoedas permitem prestar todos os serviços proporcionados por um banco, por essa razão se chama a esta actividade DeFi – correspondente a banca descentralizada.

Qual a razão para o seu aparecimento? As Criptomoedas, como o Bitcoin e o Ethereum, apesar de serem as que apresentam a maior capitalização bolsista, o seu preço apresenta uma enorme volatilidade, com variações diárias muitas vezes superiores a 20%, impedindo-as, segundo os detractores de desempenhar a função de moeda, indispensável à prestação de serviços bancários, como depósitos a prazo e créditos. Assim, criaram-se as Criptomoedas indexadas a uma divisa fiat, como por exemplo o USD.

Este é o caso do USDC (USD Coin) e do USDT (Tether), ambas moedas que têm uma correspondência de 1:1 com o USD. Como funcionam? O emissor de uma unidade de moeda virtual terá que possuir 1 USD para realizar uma emissão. Assim, se a capitalização bolsita do Tether se situar por exemplo em 50 mil milhões de USD, significa que existem 50 mil milhões de USD depositados em contas bancárias que servem de respaldo à emissão. É algo semelhante ao padrão-ouro, em que o Banco Central apenas podia emitir moeda de acordo com a reserva de ouro que possuía nos seus cofres.

A este respeito, o Sr. Carstens afirmou que historicamente o sector privado revelou fortes incentivos para se desviar da necessária segurança desse respaldo. Por outras palavras, a empresa Tether, responsável pela emissão, ao verificar que possui 50 mil milhões de USD parados em contas bancárias, terá todos os incentivos para investir esse dinheiro em aplicações de maior risco e retorno, em lugar de o deixar “parado”, a servir apenas de activo respaldo da emissão. Chega a ser irónica tal acusação!

Importa recordar ao Sr. Cartens que o actual sistema monetário é o resultado precisamente de actuações negligentes dos estados, neste caso do Banco Central e do tesouro norte-americano, em não ter sido capaz de respeitar tal critério: por cada 3 500 USD emitidos, deveriam existir 100 onças (31 gramas aproximadamente) de ouro depositado nos cofres do Banco Central norte-americano, tal como definido em 1944 nos acordos de Bretton Woods (1 onça correspondia a 1 USD). Ora, quando os EUA entraram na aventura militar do Vietname, por forma a pagar este esforço de guerra, decidiram emitir USDs sem o respectivo respaldo em Ouro. Por essa razão o acordo de Bretton Woods terminou em 1971, deixando o USD de estar indexado ao metal precioso.

Vamos então ver o brilhante histórico do banco central norte-americano. Em 1971, eram necessárias 80 gramas de Ouro para adquirir 100 USD; hoje, seriam necessárias apenas 1,65 gramas, uma perda de 98%, tal como podemos observar na figura 1. Criticar o sector privada com este histórico não me parece algo sensato.

O Sr. Carstens também se esqueceu que o sector privado está sempre a inovar, pois existem Criptomoedas estáveis algorítmicas, em que uma Criptomoeda respaldo actua automaticamente para garantir uma determinada paridade, este é o caso do UST, uma StableCoin indexada ao USD, do blockchain Terra.

A maior debilidade do Tether resulta de que a sua emissão depende da existência de um montante equivalente em USDs depositado em instituições bancárias. Existem, desta forma, vários riscos:

  • a tentação em arriscar a liquidez em aplicações de elevado risco;
  • enormes custos de auditoria e administrativos, como, por exemplo, a reconciliação bancária;
  • possibilidade de congelamento das contas bancárias por parte das autoridades; um risco muito sério nos dias que correm.

A Criptomoeda estável do blockchain Terra tem características muito particulares que eliminam por completo tanto os riscos como os custos apontados às Criptomoedas estáveis tradicionais, em particular a total independência de bancos comerciais, não existindo a necessidade de auditorias, nem tão pouco de gastos com bancos comerciais, tudo está automatizado – o código de software assim o determina e assegura.

Em conclusão, estas objecções também não parecem ter muito sentido – o sistema garante que o respaldo de activos sempre exista, com um controlo descentralizado e automático de todo o processo.

Terminou o seu discurso, afirmando que as Criptomoedas para se tornarem estáveis e credíveis deverão ser reguladas e supervisionadas de forma exaustiva. Ainda recorreu a Milton Friedman – o “liberal” que inventou as retenções de imposto, como é caso do IRS retido pelas empresas todos os meses – : “Algo como um sistema monetário moderadamente estável parece um pré-requisito essencial para o funcionamento eficaz de uma economia de mercado privada”. Segundo o Sr. Carstens, o sector privado não é capaz de proporcionar tal estabilidade. Daqui, partiu para a necessidade de serem os Bancos Centrais a proporcionar moedas digitais.

Para determinar as qualidades que estas moedas digitais deverão possuir, o Sr. Carstens indica que a o anonimato deixará de ser possível: sem a identificação exaustiva dos usuários será o fracasso!

Para tal conclusão, recorreu a dois episódios históricos para justificar tal necessidade:

  • os comerciantes europeus do século XVIII que utilizavam letras de câmbio para resolver a falta de confiança entre credores e devedores fisicamente remotos. Em vez de conceder empréstimos directamente aos mutuários em cidades distantes, os comerciantes podiam fazer acordos com outras pessoas que conheciam pessoalmente, criando uma rede de pessoas distantes que se conheciam;
  • os comerciantes do Magrebe do século XI, o Sr. Avner Greif – da Universidade de Stanford – demonstrou que foi a identidade e a rastreabilidade que permitiram aos comerciantes sustentar o comércio, mesmo em longas distâncias e na presença de grande incerteza.

Ninguém compreende qual a relação disto com o anonimato: é óbvio que qualquer particular dá preferência a negócios com pessoas que conheça e confia. Estes episódios serviram para uma confissão: sem a identificação exaustiva e detalhada não será possível o combate à fraude e à evasão fiscal.

Terminou o seu discurso a comentar os dois modelos possíveis:

  • Todas as identificações, activações e registo de transacções serão realizadas directamente nos sistemas do Banco Central, podendo os bancos comerciais auxiliar nesta tarefa, em particular o onboarding do cliente no acesso à moeda digital;
  • Os bancos comerciais possuem uma conta junto do banco central que tem um saldo de moedas digitais; cada banco conhece a desagregação desta conta por cada um dos seus clientes finais; actuam igualmente na identificação do cliente (identificação biométrica, se necessário), activação do dispositivo (onde constará a carteira digital) e no registo das transacções entre os seus clientes e entre os seus clientes com outros bancos comerciais, tal como hoje sucede.

Parece que a preferência do Sr. Carstens será pela segunda opção. Os bancos comerciais serão responsáveis por transmitir posteriormente toda a informação ao seu Banco Central, nomeadamente quem utiliza, que dispositivos e carteiras estão activos, quais os montantes transferidos, em que sentidos ocorreram, e quais os saldos existentes em cada carteira digital debaixo da sua responsabilidade.

Em conclusão, tudo indica que os bancos comerciais serão os executantes deste modelo; segundo Sr. Carstens, na China o Banco Central já solicita todos os dados aos bancos comerciais de forma periódica.

Falou também da política monetária, em particular na necessidade de evitar a fuga de capitais dos bancos comerciais para o Banco Central, resultante da existência de moedas digitais emitidas precisamente pelo Banco Central, através de um limite do saldo de moeda digital por pessoa ou de taxas de juros progressivamente negativas com o aumento do saldo em moeda digital.

Terminou o seu discurso com palavras de “optimismo”: os bancos centrais são as únicas entidades bem posicionadas para nos fornecerem moedas digitais. Em conclusão, parece-me que estes projectos não são mais que uma resposta ao enorme sucesso das Criptomoedas, dado que estas estão crescentemente a substituir o sistema financeiro tradicional.

Destaques Autor
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Luís Gomes